Bypass ureteral subcutâneo em gatos
Palavras chave: cálculos renais, gatos, cirurgia
De que se trata?
O Bypass Ureteral Subcutâneo (SUB) foi descrito pela primeira vez há mais de 20 anos em medicina humana, como uma alternativa cirúrgica no tratamento de pacientes com obstruções ureterais (os ureteres consistem em duas estruturas tubulares que conduzem a urina formada no rim até à bexiga). Esta técnica inovadora já se encontra disponível na medicina veterinária tendo sido desenvolvidos dispositivos ureterais subcutâneos exclusivamente destinados para os nossos animais de companhia.
Através da utilização deste dispositivo a urina passa através de um sistema artificial, colocado cirurgicamente, e evitando o ureter do animal que não se encontra viável. Este sistema consiste na colocação de um cateter de nefrostomia (no rim) e outro de cistostomia (na bexiga) conectados a um sistema porta subcutâneo que permite a lavagem do dispositivo e a recolha de urina para análise (imagem 1).
Quais as principais causas de obstruções ureterais?
As obstruções ureterais são cada vez mais comuns nos animais de companhia e podem ter várias causas, entre elas a presença de cálculos ureterais (ureterolitíase), tumores, traumas, estenoses, coágulos sanguíneos, infeções, inflamações, existência de ureteres ectópicos e causas iatrogénicas. Esta patologia pode afectar um ou ambos os ureteres.
A ureterolitíase é uma das causas mais comuns de obstrução ureteral em cães e principalmente em gatos. Apesar dos cálculos poderem ter várias composições, está descrito que mais de 98% dos urólitos em gatos e mais de 50% nos cães têm na sua constituição oxalato de cálcio. Estes não podem ser dissolvidos recorrendo ao tratamento médico convencional e em caso de persistência recomenda-se o tratamento cirúrgico. Este pode incluir a sua extração ou pode estar indicada a aplicação de um SUB de forma a permitir a passagem da urina.
Quais os sinais clínicos de ureterolitíase e como se diagnostica?
Os cães podem apresentar sinais clínicos como poliúria (aumento do volume de urina), polaquiúria (aumento da frequência urinária) ou estrangúria (eliminação da urina de forma lenta e dolorosa). Pelo contrário, os gatos apresentam sinais clínicos mais inespecíficos tais como perda de peso, inapetência e vómitos.
Em caso de suspeita de ureterolitíase recomendam-se análises sanguíneas e imagiologia (ecografia abdominal, radiografia abdominal e TAC) de forma a avaliar o trato urinário quanto à presença de cálculos ureterais. Geralmente, a dilatação da pélvis renal juntamente com dilatação ureteral secundária a uma lesão obstrutiva visível caracteriza uma imagem diagnóstica de ureterolitíase.
Como se faz a aplicação de um SUB?
O bypass ureteral subcutâneo é colocado no animal sob anestesia geral e através de laparotomia como forma de expor o rim afetado, o ureter e a bexiga. O cateter de nefrostomia é usualmente fixado no polo caudal do rim, enquanto que o cateter de cistostomia é inserido no ápex da bexiga. Ambos os cateteres são conectados a um sistema porta que é posicionado por baixo da pele do animal.
Após a cirurgia de colocação de SUB os animais deverão permanecer hospitalizados entre 3 a 5 dias.
Quais os principais benefícios da aplicação de um SUB em detrimento das outras técnicas cirúrgicas?
Uma vez que a técnica cirúrgica descrita não envolve a manipulação ureteral, e, tendo em conta o pequeno tamanho dos ureteres dos cães e principalmente dos gatos, torna-se numa técnica de eleição devido à ausência de formação de estenoses no local onde se removeriam os cálculos. Também é a técnica mais indicada em caso de múltiplos cálculos num ou em ambos os ureteres. O risco de perda de urina também é diminuto. Adicionalmente, a cirurgia descrita está associada a taxas de mortalidade bastante reduzidas (rondando os 6%) e a taxas elevadas de sobrevida. Cerca de 90% dos tutores mostraram-se completamente satisfeitos após a realização do procedimento.
Quais as principais complicações associadas à aplicação de um SUB?
As complicações relatadas incluem perdas de urina (3,4%), torção dos cateteres (5%) e oclusão dos mesmos com coágulos sanguíneos (7,5%). A longo prazo pode ocorrer mineralização do dispositivo (25%), sendo que em apenas 13% dos pacientes é necessária uma segunda intervenção cirúrgica com objetivo de desobstruir o bypass ureteral. Em cerca de 21% dos gatos podem desenvolver-se infeções do trato urinário (nos 10 dias seguintes à cirurgia), sendo que em apenas 10 % se desenvolvem infeções crónicas. Também existem relatos de animais que apresentam disúria (micção dolorosa) após a cirurgia (8,2%).
É importante salientar que todas as complicações descritas podem ser evitadas ou minimizadas sempre que o procedimento for realizado por um cirurgião veterinário treinado e com experiência.
Que tipo de monitorização é necessária após a cirurgia de colocação de um SUB?
Recomenda-se que seja feita a lavagem do dispositivo no prazo de um mês após a sua colocação, sendo que as lavagens posteriores deverão ser realizadas a cada 3-6 meses. A lavagem é normalmente feita sem sedação ou anestesia através do sistema porta subcutâneo.
Antes da lavagem é colhida uma amostra de urina de forma a garantir que não existe infeção do trato urinário. Recomendam-se ainda controlos regulares da função renal.
Joana Sousa, MV
Nádia Monteiro, MV